As 70 mil testemunhas que estiveram no Campo de Marte, em São Paulo, presenciaram aquele que poderia ser chamado sem chances de errar de o último show de rock.
Afinal, qual banda ou artista pode hoje em dia se dar ao luxo de fazer um show praticamente sem efeitos especiais, com quatro caras vestidos de preto quase imóveis no palco?
Pois o Black Sabbath, se não com sua formação original, mas com 3/4 dela, transformou a noite de 11 de outubro de 2013 numa viagem às profundezas da alma, dos pesadelos e da inquietude. Afinal, se em 1966, os Rolling Stones pediam para pintar tudo de preto, foi o Black Sabbath o responsável por acabar de uma vez por todas com a ilusão do discurso paz e amor que entorpecia o rock.
Muito antes do esperado, às 21h04, com parte do público ainda nos bares, banheiros e filas, as sirenes começam a tocar. Sobem as cortinas e lá estão Ozzy Osbourne, Tony Iommi e Geezer Butler, acompanhados na bateria pelo convidado Tommy Clufetos. Entram os acordes baixos e pesados de “War Pigs”. É impressionante, mas existe algo mais preciso para explicar a covardia das guerras atuais, com seus drones e armas químicas?
“As the war machine keeps turning / death and hatred to mankind” (“como a máquina de guerra continua a girar / Morte e ódio à humanidade”). Ozzy puxa o coro e nós obedecemos: “Politicians hide themselves away / they only started the war/ Why should they go out to fight? / They leave that role to the poor, yeah!” (Políticos se escondem / Eles só começaram a guerra / Por que eles deveriam sair para lutar? / Eles deixam esse papel para os pobres).
Os quatro desajustados de Birmingham ainda vomitam sua música com a mesma valentia e ferocidade dos velhos tempos. Sim, creio que Bill Ward faz falta. Seu estilo arrastado e milésimos de segundo atrasado tornava o som do Sabbath mais poderoso. Tommy Clufetos é preciso demais, certinho demais. Certinho até no longo solo de bateria, que é a deixa para a cerveja.
Mas nada apaga a magia das canções emblemáticas, que vão sendo enfileiradas uma a uma. Parte de nós é levada para outros tempos, para épocas em que não existia MTV (opa, ato falho!), Facebook, Rock in Rio e Internet. O rock era quase uma cultura underground, um troço de desajustados, trilha sonora de fliperamas enfumaçados do centro de São Paulo e moleques com dinheiro apenas para o ônibus.
Sim, talvez haja um excesso de nostalgia na coisa toda, um excesso de respeito pelos caras. Mas quem se importa se eles entregam “In The Void”, “N.I.B” e “Snow Blind”? Ou quando entram os acordes de “Iron Man”? Mesmo quando tocam as três canções do disco novo, “13”, o Sabbath é poderoso. Estamos todos ali para celebrar uma reunião que parecia impossível.
Ao final, depois de “Paranoid”, ficou a sensação de “queremos mais”. “Sabbath Bloody Sabbath”? “Changes”? Bom, o dia das crianças ia começar e todos, elevados, fomos embora com a alma lavada e os corações abençoados por Ozzy.
OBS: Nota destoante apenas para o espaço do show. O Campo de Marte está totalmente esburacado e um túnel de vento impacta a qualidade do som. Evite, se puder.
Edu Giraldes – Formado em Jornalismo, trabalha como analista de projetos multimídia em telecom e coleciona vinis. Colaborou gentilmente com o Blog Vishows, nos representando nessa imperdível experiência de ver o Black Sabbath em pleno 2013.
Apesar da ausência de Bill Ward, o show deve ter sido fueda!!
Ainda não me conformo em não ter ido, pelo jeito, foi a única e, talvez última chance de assistir a formação original do Sabbath em terras brasucas.
Ouvia compulsivamente os quatro primeiros discos do Sabbath por anos.
Viva ‘os quatro desajustados’ de Birmingham!
E o show foi incrível mesmo!!
Mas como vc descreveu, merecia um espaço melhor!