The Wall no dia 03/04, 3ª feira e eu, que adoro rock, me peguei com várias dúvidas rolando na cabeça: “Será que ver o show sentada vai ser chato?”, “E as músicas mais pesadas e lentas, como o cara vai manter o ritmo?”…
Com o Estádio do Morumbí lotado e só surpresas positivas: 5ª fileira da área Prime, de frente pro palco, muito mais perto do que parecia; luzes apagadas e não é que o show começa às 21h00 em ponto?! Nunca vi isso! Bem que Roger Waters tem fama de maníaco perfeccionista… quem contou com o atraso de sempre, nessa hora perdeu o começo, mas ainda teve muita coisa pra ver e enlouquecer.
E lá, naquele palco enorme, muro de 11 metros de altura, um telão gigante com uma projeção perfeita – viva a tecnologia! – o som de aviões vindo de tudo que é parte, parecendo sobrevoar as nossas cabeças. Aliás, o lance do avião acontece rápido, mas é mágico!
As projeções misturam imagens originais do filme com temas atuais, guerras recentes, a crítica ao consumismo e aos rios de dinheiro desperdiçado nas guerras e que serviriam para aplacar a fome no mundo, homenageia Jean Charles e chama o jovem brasileiro a tomar as ruas pra combater a corrupção institucionalizada no País.
O show sobe e desce num ritmo louco, próprio, diferente pra quem está acostumado a performance bombando o tempo todo ou esperava ver um apogeu de guitarras, solos e correria no palco. Aqui é tudo coreografado nos mínimos detalhes. As músicas da 1ª parte vão rolando e a produção vai instalando os tijolos. É colocar o tijolo no muro e a imagem projetada inclui aquele “pixel” imediatamente, numa fração de segundo, não dá tempo de piscar que a gente perde.
Tecnologia e sincronismo puros! Imagens alucinantes, som perfeito, daqueles shows que viram um divisor de águas.
Fim do espetáculo e teve de tudo: gente que adorou, que saiu tonto (como eu), que disse que gostou mais do palco do Iron Maiden e esperava mais do The Wall, que teve sono… Assim como a vida, é impossível agradar a todo mundo, com show de rock não é diferente.
Pra mim, foi mágico. Megaprodução. Valeu cada segundo e cada centavo.
Por Isabelle Gretillat – Grande amiga, roqueira e finalmente colaboradora do Blog Vishows !
Não digo ser rockeiro, acho que ainda estou longe disso.
Mas fui ver o show por conhecer algumas músicas e gostar.
Enquanto músico, passei a definir atrações musicais como: apresentação musical; Show; SHOW e ESPETÁCULO! Isso se deve ao empenho da banda e estrutura montada para o show.
Roger Waters foi o primeiro dessa última categoria, ele mudou meu conceito de shows, o que ele mostrou no Morumbi foi muito mais do que isso, ele mostrou que música é apenas uma parte do que você deve mostrar ao seu público.
Estava ensaiando para escrever aqui no blog sobre o ESPETÁCULO de domingo, mas me sinto totalmente contemplado nas palavras da Isabelle.
Roger Waters no Morumbi, 03/04/2012 – Nossos muros se reforçam
Relutei em escrever nesse tom, pois o formato de texto-depoimento me incomoda, soa um desabafo que sempre parti de um incômodo individualizado, do tipo: ai, eu fui lesado, incomodado e quero justiça. Não é isso, mesmo que pareça.
Sabemos que a vida é contraditória. Sabemos também, que vivemos e viveremos momentos díspares, daqueles que nos deixam eufóricos ou putos. Os do tipo alegre-eufórico, talvez tenham a mágica de nos retirar, ao menos momentaneamente, as contradições de nossas vidas, são momentos mais lineares, suaves, nos deixam numa espécie de alfa e assim nos permitem distanciar da realidade, com ou sem lisergia.
Por outro lado, ficamos mais putos, quanto mais nos aproximamos da realidade. Mais próximos da vida concreta, mais próximos de suas contradições e, portanto do seu duplo concreto-abstrato.
Naquele dia, o concreto era a bela apresentação audiovisual de “The Wall” com Roger Waters: bairro nobre, estádio nobre, palco moderno, artista renomado, carros, caminhões, som, aço, motos, pessoas e dinheiro, muito dinheiro. Seu aspecto abstrato é revelado pelas intenções e motivos de ser do espetáculo, os fundamentos de sua existência. Quem propôs este espetáculo? Com qual intenção? Quem se interessa por esse espetáculo? Com qual motivação? No fim destas questões nos encontramos, público e artistas na última terça-feira, no Estádio do Morumbi. Mas pra quê?
A abstração deste espetáculo, passa ainda, por fortes intenções históricas de contestação, subversão e crítica à sociedade moderna. Passa também, por um suposto encontro de gerações das décadas de 70 em diante. E passa, fundamentalmente, pela reflexão dos muros que existem nos e entre os indivíduos; nas e entre as culturas; e na geopolítica própria da concepção de país.
É certo que inúmeras foram as mudanças geracionais de 1970 pra cá, mas aposto nesse momento em uma delas: o aprofundamento e metamorfose das formas fascistas próprias de uma sociedade mediada por coisas.
O tempo muda as coisas, mas não às explica. Pelo contrário, a confiança no tempo nos confunde, nos enche de esperança, carrega o ideal de futuro, de ascensão, de melhora. As coisas não melhoram porque o tempo passa. Mas as coisas mudam, de fato. Para melhor ou pior? Depende da referência de sentimento e de análise.
A realidade moderna tem por princípio de sobrevivência a falsa aparência do sucesso. Por isso, aparentemente estamos socialmente bem, mais educados, menos analfabetos, mais conscientes, mais comunicativos, temos mais amigos. Aparentemente a fome diminui, os muros foram quebrados, o preconceito se dilui, retardamos a morte, a velhice, aparentemente estamos mais belos, com mais peito, menos rugas, mais músculos aparentes, estamos mais centrados, nos conhecemos melhor, somos mais decididos. Na aparência, somos indivíduos mais completos.
Ainda sobre nossa evolução como ser humano, acabou aquela fase de shows desorganizados, com todos misturados em uma grande área aberta e suja, com pessoas sujas e drogadas. Hoje temos um novo modelo de shows: Credicard Hall. Estamos mais organizados, mais higienizados, promovemos shows mais modernos, com garantias próprias do mundo moderno.
Temos hoje, a garantia de não termos um pobre ao nosso lado, de termos garantido, um lugar exclusivo, apenas nosso, limpo, sem interferências externas a nós, seres modernos e por isso completos. Esse novo modelo de shows não tem limites, ele pode acontecer nas casas noturnas fechadas ou mesmo em grandes espaços como um estádio de futebol. O segredo é que aprendemos a reproduzi-lo, é assim que fazemos com as coisas que aparentemente dão certo. Nossa reserva de lugar pode inclusive ter um código que nos identifique, uma batalha naval com letras e números, assim como no programa do Bozo ou nos cinemas que hoje numeram suas cadeiras.
Para garantirmos que pessoas parecidas conosco estejam no mesmo lugar, cobramos R$100,00 para a formação do grupo de pessoas desse valor, R$200,00 para os de 200,00, R$500,00 para os de 500,00, R$1000,00 para os de 1000,00 e assim por diante e avante.
Fomos ao show de Roger Waters no grupo dos 100,00. O que nos era garantido era uma boa visão à distância de um palco que pela potência tecnológica atendeu todas as pessoas do estádio. Eram-nos também, supostamente garantidas, cadeiras individualizadas grudadas no chão da arquibancada (modelo moderno de arquibancada de estádio de futebol). Lá de cima podíamos assistir além do show, a separação da antiga pista de shows, em alas com cadeiras para as bundas de 200,00, de 500,00, de 1000,00 e sei lá mais quanto. Um show organizado nos moldes do que há de mais moderno, a construção do indivíduo individualizado. Cada um na sua, assim como cada um no seu quintal. Aquilo tudo que nos fez completo como indivíduos civilizados, limpos, com medidas perfeitas, inteligentes, cultos, está agora preservado em nossas cadeiras numeradas e espalhadas pela cidade.
Bom, mais acho que a “Tickt Fode Fun” fodeu com os de 100,00, vendeu bilhetes a mais, pois a arquibancada tinha um número de pessoas muito maior do que cadeiras protetoras de indivíduos. Aí já sabe né! O pau comeu: ofensas, empurrões, início de pancadaria e sei lá mais o quê. E é justamente no momento em que o indivíduo moderno, limpo, culto, e o caralho a quatro, vê sua carapaça protetora (tecida de egoísmo) ser violada, é que ele se revela. Retirando as exceções, que servem apenas para confirmar a regra, as pessoas estavam incomodadas em dividir o espaço, pois haviam se posicionado em frente a uma daquelas bostas de cadeirinhas que foram inventadas justamente para a não mistura de gente, o não contato entre pessoas. Os rostos eram de raiva, ódio, aversão ao outro, nojo.
Lembrando que isso acontecia no mesmo show que tem como fundo ideológico a não guerra, a não segregação por muros, que dizia não à escola, não ao capitalismo.
A questão é que a mensagem de uma música que expõe um debate importante sobre nossa sociabilidade, se foi um dia, não é mais compreendida. Nós, dessa geração, consumimos os mitos sem entendê-los. Pedimos pra tocar Raul sem entendê-lo. E esses talvez sejam os elementos abstratos de uma concretude intensificada de muros individuais e, portanto fascista. Só que agora não mais um fascismo seguidor de um rosto de bigodeexterno a nós, mas um fascismo onde a face autoritária é a nossa própria, a do indivíduo ditador de si mesmo.
Me sentia muito mais seguro na concretude dos shows de pista livre, cheia de gente se encostando, agitando, se conhecendo e cedendo espaço. Neles, o aspecto abstrato, mesmo que muitas vezes iludido, era revolucionário. Tá certo, o mundo não foi revolucionado, mas o que é assustador é o aprofundamento da relação humana pautada nos interesses de troca e na competição.
Somos cada vez mais coisas codificadas e de diferentes valores, 100, 200, 500, 1000, 000000000…A aparente melhora do ser humano é sinônimo de melhora no ranking do ter. É tempo de ter para ser.
Se tenho, sou, se não tenho, não sou e também não vou. Eu tinha 100, 00 e fui. Foi o custo para perder o encantamento do mito Pink Floyd e ganhar indignação.
Além de artistas, os componentes da banda são mercadorias sendo vendidas, e nós além de fãs, somos consumidores do fetiche da cultura. A música do Pink Floyd só pode ser percebida em sua essência fora dessa relação profundamente coisificada, portanto talvez tenhamos perdido essa possibilidade.
Pelo que vivenciei no Estádio do Morumbi todo fatiado e dividido em seres humanos mais e menos valiosos, não posso esperar nada mais de uma sociedade feita de indivíduos supostamente livres e contraditoriamente aprisionados no muro abstrato do individualismo. Saímos do show da última terça-feira (03/04/2012) mergulhados na ilusão de que a partir daquele dia quebramos o muro junto do Roger Waters.
Sei lá, tô achando é que batemos a cabeça no muro. Tô me sentindo tonto…
“Saímos do show da última terça-feira (03/04/2012) mergulhados na ilusão de que a partir daquele dia quebramos o muro junto do Roger Waters.
Sei lá, tô achando é que batemos a cabeça no muro. Tô me sentindo tonto…”
Eu tbem estava lá!! Foi ótimo!!
Fiquei nas cadeiras de 300,00 e minha única indignação foi de permanecer sentada… isso me incomodou, tinha horas que eu pensava em pular ali pro gramado, pois éramos do primeiro andar…!!
Agora, um dorito pequeno 6,00 um cachorro quente 12,00 e a bud (que nem é aquilo tudo, sou bem mais uma brahma) 6,00 a lata?? absurdo demais… entao além dos 300,00 de ingresso, foi mais 60,00 de conveniência… conveniência?? tudo era pago e caro.