Na sua volta, Twin Peaks presenteou o público com um seriado instigante e com trama complexa, onde não é sempre necessário que todas peças necessariamente se encaixem, fazendo com que suas cenas sejam colocadas num profundo e dinâmico mural de personagens e expectativas que interagem entre sonho, misticismo e realidade.
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Twin Peaks foi um fenômeno pop da TV ainda no limiar do analógico para o digital bem no início dos 90’s.
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Atualização semanal – Indo até o episódio 18 (22 Dezembro de 2017)
A série voltou para uma terceira temporada após mais de 25 anos de seu último episódio ter ido ao ar na TV norte americana, causando um estranho frisson entre fãs da época e aficionados mais jovens.
Mas em se tratando de Twin Peaks, uma das séries mais bizarras da história, tudo mesmo pode fazer sentido.
Na época, a série original foi uma verdadeira febre, com mais de 30 milhões de pessoas assistindo o episódio de estreia do mago David Lynch nos EUA.
Logo de cara, uma morte, justo a queridinha da cidade… ou para muitos a mais bandida… a linda Laura Palmer, e que junto a um estranho agente do FBI (Agente Cooper) interpretado pelo ótimo Kyle MacLachlan, conquistaram corações e mentes de uma geração.
A história é realmente surreal, desnudando aos poucos segredos e intimidades de diversos personagens da mítica cidade, onde nada é tão pacato ou idílico como parece.
Tudo se desenvolve num mix de novela adolescente, trama policial e horror metafísico que fizeram da série um Cult instantâneo e que deu ao universo televisivo um repertório e estética até então inéditos.
[red_box]Foram lançados livros, palestras e grupos de estudo tentando encontrar sentido nos estilhaços de uma história que girava ao redor do macabro mantra: Quem matou Laura Palmer?[/red_box]Confesso que fui mesmo um desses maníacos por Twin Peaks, então posso garantir após assistir o ótimo episodio 1 que toda magia está lá, 100% intacta.
Mas se você é novato no assunto, nunca assistiu e não está entendendo nada da série ou do post, saiba que isso já é um bom começo.
Tudo em Twin Peaks é assim estanho, inclusive seus criadores que parecem super à vontade na lúgubre trama.
Mas quem mesmo matou Laura Palmer? (Spoiler Alert – se não quer saber melhor parar aqui, e ir para a playlist no fim do post…)
Por incrível que pareça essa é uma questão ao mesmo tempo simples e complicada de responder.
O responsável foi o pai de Laura, o obsessivo Leland, que com múltiplas personalidades desenvolveu em “Bob” um perverso alter-ego, que abusava de Laura por anos e anos até finalmente matá-la.
Na trama o Agente Cooper vai tão longe na busca da verdade que encontra o próprio “espírito do mal” que domina Leland vindo direto de um universo paralelo… numa trama complexa mas 100% sólida se considerarmos que em Twin Peaks as coisas são mesmo fora da caixa e que Bob como espírito maléfico que é, continuará sua sina de abusos sexuais e mortes.
Foi louco se reencontrar com Laura Palmer, com o policial Hawk , com a sensitiva Log e com o universo no mínimo bizarro da série, que tem na trilha sonora um dos seus maiores trunfos.
Em 1989, David Lynch e o compositor Angelo Badalamenti criaram o tema princial em pouco mais de 20 minutos, usando um teclado Fender Rhodes, com o diretor sugerindo que se a canção ficasse bem lenta seria mais bonita.
Nascia uma obra prima, onde os sintetizadores conseguiram mostrar toda neblina e cinza carregados com a morbidez da história, e fizeram que o som e as imagens da época ficassem impregnadas no inconsciente coletivo de gerações.
A trilha original da primeira temporada, parece mais atual do que nunca!
Na época o próprio David Lynch escreveu os versos das canções “Falling”, “The Nightingale”, “Into the night”, “Just You” e “Sycamore Trees” na primeira temporada, além de “A real indication”, “Questions in a World of Blue” e “The Black Dog Runs at Night” em Fire Walk With Me (segunda temporada) de 1992.
Toda trilha foi considerada brilhante e aclamada pela crítica da época, recebendo inclusive em 1991 um prêmio Grammy como melhor performance pop instrumental.
A trilha sonora original da série é conhecida como Music from Twin Peaks e foi lançada em três álbuns, a saber:
- Soundtrack from Twin Peaks (1990)
- Twin Peaks: Fire Walk with Me (1992)
- Twin Peaks Music: Season Two Music and More (2007)
Recomendo todas, mas quando parecia que não existiam mais canções relacionadas à série, o próprio Lynch soltou online os “The Twin Peaks Archive”, com 215 canções não lançadas e não utilizadas na série.
[blue_box]Vamos agora conferir canção por canção, episódio por episódio… e no final a playlist !![/blue_box]Episódios 1 e 2
A nova temporada começa com a parte musical brilhando como sempre, usando os temas originais com perfeição.
Tivemos no episódio 1 – “American Woman” (David Lynch Remix) pelos Muddy Magnolias, em cena com o Cooper atual dirigindo sua Mercedes à noite, além de “Intro Cymbal Wind” interpretada por Dean Hurley , “Sub Dream” de David Lynch e Dean Hurley, “Frank 2000” com a Though Gang, além de apresentar, no episódio 2, a ótima “Shadow” dos Chromatics.
O multi instrumentista Johnny Jewel também colaborou com a nova trilha e disse que adorou compor temas soturnos embebidos num synthpop retrô.
No episódio 03 temos a banda The Cactus Blossoms, liderada pelos irmãos Jack Torrey e Page Burkum. Eles tocam a canção “Mississippi“, do álbum You are Dreaming (2016) num clima country & western bem legal.
Confiram a canção:
A original “Dream Recall” de Lynch e Dean Hurley, é o outro destaque musical do capítulo.
Já no episódio 04 temos a super participação do Au Revoir Simone banda do Brooklyn que manda bem com a canção “Lark” de 2007, onde se destacam os super teclados e sintetizadores do trio de garotas (Erika Forster, Annie Hart e Heather D’Angelo).
O episódio também é muito legal, com super participação do próprio diretor David Lynch como o Diretor do FBI “Gordon Cole”, bem como o agente “Albert” interpretado pelo Miguel Ferrer (falecido em Jan-17) outro veterano original da série.
A outra canção que marca o episódio 04 da terceira temporada de Twin Peaks é um clássico do jazz, a super “Take Five” com o The Dave Brubeck Quartet, e que cria o ambiente para uma das melhores cenas da série.
O episódio 5 – Recap: Vegas Baby, é pródigo em sons legais. Tem Johnny Jewel mandando “The Flame” e “Windswept” de seu homônimo álbum.
No lado retrô, temos o girl group The Paris Sisters em “I Love How You Love Me”, sonzeira com produção de Phil Spector.
Curti mesmo a dupla Unicorn, que manda um som sombrio nas pesadas “Habit” e “Tabloid” em viagens psicóticas de um metalcore industrial.
Aparecem também “Good Man” com Raphael Saadiq, “I Am” com a Bluntedbeatz, “The Stars & Stripes Forever” com Banda do Exército Americano e “Grady Groove” de Angelo Badalamenti, interpretada por Grady Tate.
Mas o grande destaque acaba sendo mesmo o Trouble, que faz sua estreia planetária na série com a canção “Shake Eyes”.
A banda tem o filho de Lynch, Riley Lynch nas guitarras 🎸, que junto a Dean Huey nas baquetas e Alex Zhang Hungtai no Sax, se apresentam no Bang Bang Bar durante a introdução do personagem Richard Horne, que parece saído direto de Veludo Azul.
Já no episódio 6 – A Dark Age: Temos Cooper cada vez mais como Doug, um anão assassino além de muitas e muitas mortes – o mais bizarro de todos episódios até o momento… a morte espreita o agente Cooper… e o destaque musical é a fenomenal Sharon Van Etten, tocando ao vivo a ótima “Tarifa” e mostrando sua ótima banda e a super combinação de harmonias folk.
Sharon é original de New Jersey, já gravou os álbuns, Because I Was in Love (2009), epic (2010), Tramp (2012) e Are We There (2014), além do EP I Don’t Want to Let You Down de 2015, se destacando por conseguir dar um frescor delicado, num gênero tão tradicional como o folk.
No episódio as canções “Windswept” de Johnny Jewel, “Good Man” com Raphael Saadiq e “I Am” com a Bluntedbeatz reaparecem, assim como o tema “Accident / Farewell Theme” de Angelo Badalamenti.
Mas assustador é o episódio 8 – terror mesmo, apocalipse (Tem uma luz?) – que teve os Nine Inch Nails em “She’s Gone Away” além de sons clássicos como “Threnody for The victims of Hiroshima” de Krzystof Penderecki, os vocais dos The Platters em “My Prayer” e o próprio Lynch com Dean Hurley na inédita “show 30’s Room”… doideras… doideras.
Ainda tivemos um trecho da Sonata de Piano 14 de Beethoven em remix de David Lynch.
No episódio 9 – O Retorno, são essas as canções apresentadas : “Deer Meadow Shuffle” e “The Chair” de Angelo Badalamenti, “Human” ao vivo no Bang Bang Club com Hudson Mohawke, assim como “A Violent Yet Flammable World” com o Au Revoir Simone.
Também temos o tema “Tone / Slow Speed Prison / Low Mood” com Dean Hurley.
Fechando nossa mega atualização de Twin Peaks temos o episódio 10 (Laura é a escolhida) – que tem a volta do chato Doug e o nosso novo vilão assassino abusando até da própria avó… mas em compensação 5 sons muito legais… a maioria já na playlist como Johnny Jewel em “Slow Dreams” e Rebekah Del Rio com “No Stars” – com o “eletrônico” Moby nas guitarras em canção de David Lynch.
Completam a trilha do episódio “Headless Chicken” mais um som novo de Angelo Badalamenti e Lynch, interpretado pela Thought Gang, o clássico antigão de 1936 “Charmaine” de Erno Rapee e Lew Pollack interpretado pela Mantovani and his Orchestra e outro clássico esquecido da cultura americana “Red River Valley” com o veterano ator Harry Dean Stanton.
Também inclui imagens e sons que nos lembram o Episódio 8 (“Gotta light?”), com algumas das mesmas músicas que Lynch usou para marcar a odisseia espacial do mal com a eclosão da bomba atômica, reutilizando novamente a obra “Threnody para as vítimas de Hiroshima” de Krzysztof Penderecki.
Se preparem… que vamos ter no episódio de cabeça implodida até “quase” zumbis, com momentos de humor subvertidos pelo terror característico da série.
Os destaques musicais do episódio foram: “Frank 2000” de Angelo Badalamenti e David Lynch com a “banda da série” a Thought Gang, a sonzeira de “Viva Las Vegas”, consagrada na voz de Elvis, na melhor cena do episódio em super versão da cantora e compositora Shawn Colvin.
Não tivemos nenhuma apresentação musical em Twin Peaks, mas a surpresa de termos o próprio Angelo Badalamenti ao piano no jantar que fecha o episódio com a inédita “Heartbreaking”.
Já o episódio 12 – “Let’s Rock”, acabou sendo bem mais leve que os últimos mas não menos intenso, com a volta da trama para Twin Peaks, nos brindando a todos com personagens clássicos da série.
Depois do episódio 11 não ter nenhuma passagem no Bang Bang Bar, voltamos ao local entre cervejas em ação de merchandising bem explícita da Heineken, com cena incrível de DR entre amigos, e sonzeira instrumental da banda Chromatics, que já havia aparecido no segundo episódio da temporada.
Dessa vez tocaram a canção “Saturday”, composição de Johnny Jewel com seu projeto paralelo Desire que inclui dois membros “cromáticos”, o próprio Johnny Jewel e o músico Nat Walker.
No episódio a canção é interpretada pelos Chromatics de forma brilhante, usando a singela e assombrosa melodia como tema do fim do episódio, para alegria dos adeptos da série.
Chegamos ao episódio 13 – “Que história é essa Charlie” – com o personagem Dougie’s dominando de forma hilária o plot do episódio, com seu parceiro de trabalho sendo desmascarado ao confessar que tentou matá-lo.
No Black Lodge, a tentativa de devolver o lado maligno do agente Cooper não prospera, garantido fortes emoções para a temporada, na melhor cena de Kyle MacLachlan como Mr.C, usando seus poderes mas sem nenhum glamour no ato de matar.
Já o sadismo aparece mesmo com o vilão Richard Horne em sequências brilhantes e bem violentas.
Dessa vez, a “performance da casa” ficou por conta do personagem James Hurley (o namorado secreto de Laura Palmer na temporada original), sempre interpretado pelo ator James Marshall, que canta uma estranha canção de Lynch/Badalamenti chamada “Just You”, fechando o nostálgico episódio.
Também tivemos “Swan Lake, Ballet Suite, Op. 20: III. Dance of the Swans” com a Orquestra Estatal Húngara e Emil Edlinger e “Eastern European Symphonic Mood No. 1”, com Dean Hurley.
Nesse episódio 14, tantas coisas se destacaram… mas entre elas a profusão de “Vórtices” e a volta de David Bowie marcaram presença e simbolismos densos na quase 1 hora de duração.
Vale ressaltar o protagonismo dos personagens de Gordon Cole e Lucy, e o aparecimento de páginas desaparecidas do diário de Laura Palmer, dando pistas para entendermos o surgimento dos nossos Coopers do Mal e do Bem.
E na velha Twin Peaks as coisas estão mesmo bem agitadas, com visitas ao antro que foi o “Jack Rabbit’s Palace”, que se apresenta como uma árvore mística, conectando os mundos e as memórias de Bobby – o vilão real de toda série.
Com a chegada do “the Fireman”, tudo deve se tornar ainda mais louco com o personagem parecendo um deus encarnado pronto a dar luz às maluquices da trama.
A personagem mais bizarra do episódio foi mesmo a matriarca Sarah Palmer, mas vocês tem que assistir, não vou contar aqui…
Na parte musical surpresas no Bang Bang Bar com o Alt Country da cantora e compositora Lissie, em “Wild West” de seu recente álbum “My Wild West”.
“Interior Home by the Sea” e “Tone / Slow Speed Prison / Low Mood” de Dean Hurley, aparecem com destaque no episódio.
A série evolui rápido e o episódio 15 – não é fácil desapegar, inicia com uma série de fatos insólitos, todos ligados à volta da trama para a cidade de Twin Peaks, com personagens se reencontrando e dando continuidade a pendências de décadas da trama de Mark Frost e David Lynch.
Musicalmente o destaque foi para o rock alternativo dos The Veils, que se apresentaram no episódio com a psicótica Axolotl.
Mas nesse episódio a ação de verdade no Bang Bang Bar, ficou por conta da luva verde e mágica do personagem Freddie que protagoniza cena de briga sensacional no Bar. Também vale destacar a canção de Otis Redding – I´ve been loving you too long, que aparece marcando presença na série.
Ainda rolaram : “Electricity II” com Dean Hurley, “Summer Night” com a Thought Gang, “Sharp Dressed Man” com o ZZ Top e “Threnody For The Victims Of Hiroshima” (com a Warsaw National Philharmonic Orchestra)”.
No episódio 16 – Sem Bater nem tocar a campanhia, tudo que um fãs da série quer começa de fato a acontecer, confiram:
- No episódio finalmente Doug se transforma em Agente Cooper !!
- Audrey Horne vai ao Bang Bang Bar e acaba mostrando sua dancinha mitológica para os presentes.
- O novo mega vilão Richard Horne é filho do Evil Coop e tem fim inesperado no episódio.
Fecham o episódio “Night Electricity Theme” de Dean Hurley, “American Woman” (David Lynch Remix) com Muddy Magnolias e “Audrey’s Dance (Instrumental) com Angelo Badalamenti.
No episódio 17 (O passado determina o futuro), finalmente ocorre o encontro entre os”Coopers”, e o passado volta a ficar em aberto em Twin Peaks, fechando de forma precisa todo ciclo e mistérios de quase 30 anos de Laura Palmer.
Sensacional !!
Além do tema principal ecoar em todo episódio, temos o especialista em trilhas Dean Hurley, que interpreta “Sub Dream”, composição em parceria com David Lynch.
Encerra o penúltimo episódio, The World Spins, som de Badalamenti com letras de Lynch, em super performance de Juliee Cruise.
O 18º e final episódio (Qual é o seu nome?), é o Twin Peaks pós Laura Palmer, onde passado, presente e futuro se reinventaram após as ações sobrenaturais de nossos personagens, pode ter sido um brilhante encerramento mas também um novo começo, o futuro dirá.
Não teve nenhum encerramento musical, mas foi marcante a participação dos The Platters interpretando “My Prayer”, em tórrida cena entre o Agente Cooper e Diane, se amando mas já em outra dimensão.
Foi uma satisfação dividir com todos o fascínio pela história de Twin Peaks, e espero poder voltar ao tema num futuro breve.
A cada episódio, fico já imaginando como vai ser a trilha da temporada 3, que com tantos artistas interessantes tocando ao vivo, vai garantir ótimos momentos e sonhos perversos.
Estão previstas 2 trilhas sonoras originais da nova temporada, ambas previstas para 08 de setembro, Twin Peaks (Music from the Limited Event Series) e Twin Peaks (Limited Event Series Original Soundtrack).
Todos 18 episódios dessa terceira temporada foram escritos e dirigidos por Frost e Lynch, e quase todos atores originais estão presentes.
A volta é um verdadeiro presente para os fãs que aguardaram 26 anos para retornar ao universo de Twin Peaks e também para as novas gerações que curtem as séries do planeta Netflix, e que agora podem sentir de perto o clima especial que a dupla Frost e Lynch conseguem imprimir nas telas.
Fiquem com nossa playlist – Sons para curitr a volta de Twin Peaks